terça-feira, 16 de outubro de 2018

ESPIRITUALIDADE

Como fazer para a espiritualidade de quem já está na caminhada e pensa não precisar de formação?

É muito natural acontecer a quem está servindo, completamente inserido nos trabalhos da igreja, sentir-se a certo grau preparada ao ponto de descartar qualquer formação para leigos ou religiosos existentes na sua paróquia ou Diocese.


Duas coisas são possíveis; esta pessoa pode realmente estar a certo nível, ou não, ou do contrário, nós da comunidade não estamos oferecendo uma catequese de qualidade, autêntica e substancial ao ponto de fazer com que aquele nosso irmão consiga encontrar o Senhor nos nossos encontros.


Formação;

Vale reforçar ainda que uma formação pode ter a qualidade de uma espiritualidade, ou do contrário, uma espiritualidade pode ter a qualidade de formação. O que sustenta e ajuda é a espiritualidade que têm o formador, que precisa também buscar mais para dar mais.


Não estou aqui citando espiritualidade de uma pessoa como você poderia até imaginar, alguém que seja exageradamente adorador, com o terço na mão, não. Mas sim, um pessoa que seja simples, participante da comunidade, esclarecida da palavra de Deus e capaz de ajudar seus irmãos.


Exageros cristãos não se identifica com espiritualidade, nem os gritos que alguém dá quando faz oração em público, é o próprio cristo que define espiritualidade e oração como práticas discretas e íntimas com Deus (Mt 6,6), o que também mostra melhor a fidelidade e maturidade de uma pessoa.  


Os músicos;

Quando participava de retiros de oração, ou outros encontros do gênero, observava sempre os músicos que se retiravam para fora da igreja no momento em que não estavam tocando, quando começava a palestra. Aquele gesto me incomodava e incomodava também os que participavam do encontro, pelo fato simples de não se compreender como algo pode ser bom se aqueles que estavam ajudando a realizar o encontro não a saboreavam (isso vale para todo encontro).


É verdade que não podemos obrigá-los a escutar o que não querem escutar, ou mesmo estarem dentro da sala de encontro, mas podemos inserir nos nossos encontros, pessoas que nos ajudarão de fato a evangelizar. É bom lembrar que todas as nossas ações diante da comunidade servem para evangelizar.  


Todo encontro deve ser útil para quem organiza, quem prega, quem canta e quem reza, e também os que participam, mas todos precisam estar dentro de uma mesma comunhão, experimentando de um mesmo mistério.


Na verdade é muito mais interessante um grupo participativo, que um que tenha só a vontade de fazer um pequeno show, e este será o nosso assunto de amanhã.


Palestrantes e estrelismos,

Ultimamente existe a prática de convidar palestrantes importantes para fazer palestras em nossos retiros, porém, não estão inseridos muitas vezes na realidade local, palestram e vão embora, não entendendo na maioria das vezes nem mesmo o contexto exato do encontro, com o risco de que suas palestras sejam fora da realidade, por mais que sejam boas e extraordinárias na questão de dizer algo que empolgue a comunidade, mas que na realidade não sabe como a comunidade vem caminhando e por isso seu conteúdo termina por ser abstrato, fora da possibilidade de se realizar.


O estrelismo é um risco para os palestrantes e músicos, pois qualquer atividade na igreja em que você deva aparecer mais que o Cristo que anuncia, está errada e fora da prática evangélica. Fazer uma palestra ou cantar na igreja é um serviço, e todo serviço requer humildade, e vale aqui para todas as situações o que a "Sacrosanctum Concilium" diz para os músicos "...possam ressoar a voz dos fiéis" SC 118, fora disso, não será nunca um canto de comunhão e comunidade.


E para aqueles que fazem palestras, eu ofereceria a seguinte passagem da "Apostolicam Actuositatem" 31, "E como em nosso tempo o materialismo de vários tipos está se espalhando amplamente em toda parte, mesmo entre os católicos, os leigos não apenas aprender com maior diligência a doutrina católica, especialmente naqueles pontos em que a própria doutrina é questionada, mas contra toda forma de materialismo, ofereça o testemunho de uma vida evangélica".


Esta parte é muito importante: ofereça o testemunho de uma vida evangélica.


Espiritualidade dos leigos;

Não é uma questão de você agir com exageros, muito pelo contrário, espiritualidade requer uma pessoa simples, vivendo normalmente a vida de comunidade e na sua família, participando da missa e dos encontros de seu grupo, ajudando na paróquia e realizando encontros da Lectio Divina, que é onde se pode crescer tanto ajudando também os irmãos.


Os pequenos encontros em torno do Evangelho (em pequeno número de pessoas) é o que mais faz crescer como cristão e como filho de Deus, duas coisas importantes. A espiritualidade será sempre partilha e nunca um estado de soberania porque você está mais dentro da igreja que os outros, porque canta ou porque prega, não, espiritualidade é aquela que você vai para a porta da comunidade receber os seus irmãos com alegria e se esse não é seu carisma, também não têm problema, o importante é que, o que você faça, seja pensando que servirá também ao outro.


Na espiritualidade não tem problema se você não consegue rezar sozinho, mas que se confia na comunidade para rezar juntos, não tem problema se você não é santo, porque é pelos pecadores que Cristo sai em busca e espera encontrá-los, espiritualidade é somente se entregar e confiar, sabendo que você com seus músculos não pode fazer nada, mas que é Deus que age em você, e que você é importante como todas as pessoas de sua comunidade.


Para nós leigos gostaria de deixar a seguinte passagem da "Apostolicam Actuositatem" 4b, e o versículo de João 15,5,


"Esta vida de intimidade com Cristo é alimentada na Igreja com as ajudas espirituais comuns a todos os fiéis, sobretudo com a participação ativa à sacra liturgia. Os leigos devem usar essa ajuda de modo que, conforme cumpram seus deveres do mundo na condição ordinária de vida, não separem da própria vida a união com Cristo, mas cresçam sempre mais nessa, cumprindo a sua atividade segundo a vontade de Cristo."


"Quem permanece em mim e eu nele, esse produz muitos frutos, porque sem mim nada podeis fazer."






quinta-feira, 19 de julho de 2018

Refletindo Mt 11,28-30


O JUGO
Hoje este término e o seu significado não são mais atuais. Já há muitos anos os agricultores não usam mais o arado tradicional ou primitivo, os avós agricultores de nossos pais seguramente usaram, mas já a partir deles, fizeram adaptações para que os animais não sofressem tanto para o trabalho. Porém, sob o jugo, aquele primitivo que fala o Evangelho, a cabeça do animal era obrigatoriamente abaixada em direção a terra, e assim o animal se tornava mais dócil.

A palavra jugo permaneceu para indicar uma condição de opressão, um povo obrigado a obedecer sem poder levantar a cabeça. Para alguns, a própria vida é um jugo; a vivem como um peso insuportável. Se diz que isto é um sintoma de velhice; mas, mesmo os jovens não são sempre felizes em viverem. A inquietude dos jovens se manifesta na pressa que possuem: quando serei grande, quando concluirei os estudos, quando terei um trabalho... Mas é este pensamento de futuro que distrai do presente e impede de gozar a beleza se encontra. Alguém disse: a juventude é um dom precioso, pecado que seja presenteada a gente imprudente como os jovens, que não sabem aproveitarem! Mas não só os jovens, a maior parte das pessoas vivem assim.

Um monge ancião de Valaam respondeu a um monge que veio consultá-lo sobre a vida espiritual: Tu nunca te contentarás. No inverno pensas na primavera, na primavera pensas no verão, e no verão pensas no fato que os dias se tornam menores*, e o hoje para ti é sempre um peso.

Assim fazem muitos: vivem em função aquilo que vem depois e, se não vem, se desesperam.

O JUGO DO PECADO
É uma expressão habitual na literatura espiritual dizer que os pecados pesam. Como imaginar este peso? Costumeiramente falamos de peso na consciência. Orígenes** amplia o horizonte deste conceito, até compreender o mundo todo.

Adão, istoé, o homem criado por Deus, olhava para o alto; em todas as coisas terrenas via a imagem da realidade celeste, e a natureza era para ele escola do Espírito. O pecado, escreve Orígenes, obrigou o homem a olhar para baixo, baixar a cabeça, e a ver coisas que não serviam a elevação da mente, e por isso pesavam.

O mundo é duro, mas não podemos negar que muito do que vemos seja belo: a natureza, os jovens, a arte... Mesmo se tantas coisas belas e bonitas também cansam. Como estou cansado de ver coisas belas!, suspira o protagonista do filme de Tarkovskij, "Nostalgia". É a história de um exilado na Itália, que perdeu as próprias raízes, e por tanto admirar as belas coisas do país se sente cansado, afadigado.

Também nós com o pecado, perdemos nossas raízes, nos tornamos exilados no mundo e a vida para nós se torna um peso.

TOMAI SOBRE VÓS O MEU JUGO
Exilado é quem quer fugir do jugo cotidiano. Ou até mesmo aceitar portar com Cristo, se tornaria mais leve.

Os autores espirituais dão quatro possíveis razões pelas quais o jugo poderia não pesar mais. 1. A consciência da própria força, a confiança de ser capaz de portar aquele peso, porque Cristo nos assegura que ninguém será provado além de suas forças. 2. A consciência que aquele peso devemos portar só por certo pedaço de estrada; a vida é breve, comparada a eternidade. 3. A livre aceitação daquele peso por amor: quando se ama alguém, levamos com gosto também suas pesadas malas. 4. Quando levamos o peso em duas pessoas se pesa menos, e nós de fato portamos o nosso jugo juntos com Cristo.

Porém, se estas razões fossem só expostas assim, em abstrato, não seriam muito convincentes. Ganham valores se vem da experiência de quem já as viveu. Santa Ludwina*** não conseguia suportar a sua grave doença e pensava em suicídio. Mas, em um certo ponto do seu sofrimento compreendeu que estava sofrendo com Cristo. Morreu serena dizendo: se soubesse que com uma Ave Maria obteria a saúde, creio que não rezaria.

Cardeal Tomás Spidlík 


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*Na Europa
**Orígenes, cognominado Orígenes de Alexandria ou Orígenes de Cesareia ou ainda Orígenes, o Cristão, foi um teólogo, filósofo neoplatônico patrístico e é um dos Padres gregos.
***Santa Liduina.